Sobre este Blog

“Disse que seu livro se chamava o Livro de Areia, porque nem o livro nem a areia tem princípio ou fim. (...)
O número de páginas deste livro é exatamente infinito. Nenhuma é a primeira; nenhuma, a última”.

Jorge Luís Borges, O Livro de Areia

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Do Esquecimento



Sobre um tema de Camus


Eis a minha história, pelo que dela me recordo.
Era, então, a Guerra, não sei mais qual delas. Havia esse soldado. E havia aquela casa onde a mulher abraçava seus dois filhos. Misericordioso, o soldado concedeu-lhe uma escolha. Disse que deixaria viver um dos meninos, o que ela mais amasse. Em lágrimas, a mãe implorou que deixasse viver a ambos. Com a mesma frieza ele insistiu na proposta: “Não seja tola. Tens a oportunidade de salvar a um dos teus. Salva aquele a quem mais amas. Do contrário terei de matar a todos.” Ela olhou para os dois filhos, como que mensurando o imensurável e sentenciou, embargada a voz: “Deixa viver o mais novo”. Sem hesitação, o soldado arrancou o preferido dos seus braços e o fuzilou. Depois atirou na mulher. Antes de sair, disse ao sobrevivente: “Nunca te esqueças que tua mãe escolheu teu irmão”. Então partiu.
            De todas as coisas me recordo com clareza. Só não me lembro se fui o soldado ou o menino.