Sobre este Blog

“Disse que seu livro se chamava o Livro de Areia, porque nem o livro nem a areia tem princípio ou fim. (...)
O número de páginas deste livro é exatamente infinito. Nenhuma é a primeira; nenhuma, a última”.

Jorge Luís Borges, O Livro de Areia

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Judite

Judite passava tanto tempo esconjurando a morte que quando morreu, numa cinza quarta-feira, ficou ainda um par de dias e  noites benzendo-se e debulhando o terço e recitando o credo ao qual emendava:  Deus-da-morte-me-livre-amém.
No alto da segunda noite, percebeu-se morta. E quando a encontraram, na manhã do terceiro dia, tinha o rosto sereno como nunca em vida.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

David

Dormia entre seixos e, mineral, sonhava: o gigante, a funda, a queda, a glória. Alguém o despertou de seu sono pétreo e ordenou-lhe: "Fala!".
Mas seu silêncio de mármore dispensava - por transcender - qualquer verbo.
 

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Da Carne

Talvez eu faça um poema,
se me assaltarem palavras
se eu for capaz de dar corpo
ao que meus olhos escutam.

Talvez eu gere um poema
de sangue, de chumbo ou de éter,
de nuvem, quem sabe, ou de nata.
Talvez eu encarne um poema.

Talvez eu vomite o poema
que há muito me oprime a garganta,
que há dias me fere o pescoço.
Talvez eu soluce um poema.

Talvez
eu seja
um poema.