Fora, havia cantos, e fogos e festa. Dentro, um
silêncio brando, um sol de trevas. Sorria, talvez, e quem não a conhecesse
teria a impressão de que era ou estava feliz. Mas ninguém a conhecia. Por isso
o estranhamento quando, no meio da celebração, deram por sua ausência. E
passaram a procurá-la, pelos jardins e depois casa adentro: foram ao porão onde não a
encontraram, ao sótão onde também não estava. Em cada cômodo e canto chamaram por seu nome. Tudo vão. E ganharam a rua e as ruas, vasculharam a cidade e
as cidades, e seguiram na busca sem alento ou descanso, até se converterem numa
horda crescente de andantes, deambulando sem rumo, esquecidos já do que ou de quem
procuravam. E logo todos éramos (como) eles.
Incógnita, ela seguia na multidão.
Ou, talvez, não.
Hyeronimus Bosch, O Jardim das Delícias (aprox. 1510) |