Sobre este Blog

“Disse que seu livro se chamava o Livro de Areia, porque nem o livro nem a areia tem princípio ou fim. (...)
O número de páginas deste livro é exatamente infinito. Nenhuma é a primeira; nenhuma, a última”.

Jorge Luís Borges, O Livro de Areia

sábado, 1 de agosto de 2015

Afrodite, ou as bodas da deusa


Fora, havia cantos, e fogos e festa. Dentro, um silêncio brando, um sol de trevas. Sorria, talvez, e quem não a conhecesse teria a impressão de que era ou estava feliz. Mas ninguém a conhecia. Por isso o estranhamento quando, no meio da celebração, deram por sua ausência. E passaram a procurá-la, pelos jardins e depois casa adentro: foram ao porão onde não a encontraram, ao sótão onde também não estava.  Em cada cômodo e canto chamaram por seu nome. Tudo vão. E ganharam a rua e as ruas, vasculharam a cidade e as cidades, e seguiram na busca sem alento ou descanso, até se converterem numa horda crescente de andantes, deambulando sem rumo, esquecidos já do que ou de quem procuravam. E logo todos éramos (como) eles.

Incógnita, ela seguia na multidão.

Ou, talvez, não.

Hyeronimus Bosch, O Jardim das Delícias (aprox. 1510)